quinta-feira, 25 de maio de 2023

 

O ROMANCE E A NOVELA

(Por Orlando Tadeu Ataíde Leite)

      Pois bem, vamos lá.

      Diferentemente do conto e da crônica o romance e a novela são narrativas mais longas e densas, especialmente o romance, considerado a "prima-dona" das narrativas literárias. A novela, por sua vez, funciona como um meio-termo entre o próprio romance e o conto, sendo, digamos, um gênero mais extenso que o conto e menos que o romance, algo se aproximando de duzentas páginas.

      Na novela, fundamentalmente, o que funciona são os eventos, os episódios, as "fofocas" de rua ou entre vizinhos, os "causos", ou seja, tudo aquilo que envolve diretamente as personagens, seus movimentos dentro do contexto estabelecido pelo roteiro, tudo para gerar aquele clima de tensão e de expectativa no leitor ou no espectador, que, ansioso e atento, espera pelo próximo capítulo. Interessante observar que o termo "novela" remete sempre à televisão, às famosas "telenovelas", tão apreciadas no país.

      O texto "O alienista", de Machado de Assis, por exemplo, transita entre os conceitos de novela e conto, em que uma personagem que considera todo mundo louco acaba por se trancar no hospício por acabar descobrindo-se como o "louco-mor", o que nos leva a perceber a essência da novela, ou seja, o evento tópico, local, até mesmo recheado de humor, que "carrega" o enredo.

      O romance, por sua vez, além de muito mais extenso, traz consigo uma densidade que vai além do simples evento ou fato, abordando aspectos da psicologia das personagens e de suas relações sociais, estabelecendo verdadeiras "teses" a serem "desvendadas" pelo leitor, espécie de "rato de laboratório" do romancista, como ocorre na famosa trilogia de Machado de Assis, especialmente no genial "Memórias póstumas de Brás Cubas", ou no não menos genial "Dom Casmurro", quando o autor deixa para o leitor a missão ingrata de desvendar o mistério da traição ou não da pobre Capitu.

      No romance, tudo é grandioso, desde as descrições de cenários, de cenas de referências  espaciais e temporais, até mesmo de estratégias de retornos e de avanços no decorrer da narrativa. No famoso romance "Dona Flor e seus dois maridos", de Jorge Amado, denso e longo, a história do pândego Vadinho e da "recatada" Dona Flor inicia justamente pelo "fim", com a morte abrupta do protagonista em um divertido desfile de carnaval de rua, sendo, a partir daí, contada desde o "começo", quando a protagonista fica dividida entre um amor "desvairado e divertido" e outro "recatado, seguro e sereno", abordagem psicológica sempre tão recorrente e atual.

      Portanto, percebe-se o "genoma" do gênero romance gravado nessa perspectiva de análise social a partir de um contexto de tempo, espaço e de análise psicológica profunda e densa das personagens envolvidas na história, como também ocorre com o famoso, "Vidas secas", de Graciliano Ramos, também transitando entre novela e romance, quando o leitor entra em contado quase que direto com a árida e selvagem paisagem do Sertão, que oprime almas e desenha o comportamento, também "árido e selvagem", do protagonista Fabiano e de sua família, todos "moldados" à feição do sofrimento como vítimas das secas nordestinas, retirantes perdidos e sem rumo.

Então é isso. Espero ter contribuído

                                                                                              Orlando Tadeu Ataíde Leite

 

TEORIA LITERÁRIA  APLICADA

DIFERENÇAS ENTRE CRÔNICA E CONTO

(Por Orlando Tadeu Ataíde Leite)

      Muitos se perguntam se os gêneros literários "crônica" e "conto" são a mesma coisa ou se são diferentes. Essa dúvida parece resultar do fato de que essas são modalidades literárias geralmente curtas e lidas de "um fôlego só". Há, por exemplo, contos de uma página só, embora haja outros, como "O alienista", de Machado de Assis, com 100 páginas! Há, ainda, outras semelhanças entre "crônica" e "conto", como o número reduzido de personagens e de núcleos narrativos.

      Mas o elemento principal que separa os dois tipos de narração é quanto à natureza da abordagem. Veja: eu estou querendo produzir um "conto" sobre, por exemplo, um fato ocorrido com um tio meu que mora no interior. Ele sempre gostou de desenhar e de construir barcos,  e, mesmo sem ter grandes conhecimentos de engenharia náutica, fazia tudo a partir das experiências empíricas que realizava.

      O que faço? Vou construindo, passo a passo, minha narrativa, pensando como meu tio era, como se comportava, como vivia. Penso na cidadezinha onde morava, na sua família, nos amigos. A partir daí, já tenho elementos suficientes para criar a minha história. Procuro um título, e vou desenvolvendo meu trabalho, começando com o cenário, apresentando possíveis personagens, focando no enredo, com o protagonista construindo seu barco e fazendo muitas viagens, ficando famoso com sua genialidade.

      Dá para perceber que houve todo um trabalho, um arcabouço, uma elaboração mental para a elaboração do conto, aqui produzido a partir de um processo ficcional focando uma realidade que o narrador conhece.

Já na elaboração da "crônica", o processo é mais simples e dinâmico, pois nasce a partir de "flashes", de "frames" do cotidiano, a partir daquelas situações tão comuns que presenciamos todos os dias em casa, no trabalho, nas ruas, enfim, nessa interação vivencial de todos os dias. A diferença é que simples fatos ou ocorrências tornam-se "picos de inspiração" para o escritor, que cria o texto a partir do momento, sem muita elaboração ou planejamento.

      Vou pela rua e vejo uma senhora descascando uma banana e dando para um macaquinho em um zoológico. O cidadão comum não vê nada de especial nisso. Mas o cronista não deixou de perceber o olhar de satisfação da senhora e o de agradecimento do pequeno animal.

Aí, nesse momento sublime da criação estética, nasce a crônica!!

                                                                               Orlando Tadeu Ataíde Leite

 


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